terça-feira, 5 de março de 2013

Poema Existencialicísmico


Existir é curioso porque ser humano é saber firmemente que se pode ser mais
Ter esta consciência, ainda que de forma um tanto indigente, atrapalha-nos
Daí nasceu, quem sabe, o verbo querer e suas tão inviáveis atribuições
Sim, o verbo querer, para que se dê um nome a tudo o que ainda não nos há
Para sermos motivados pelo irreal destino, e isto sempre há um passo de nós
E para que nossa minuciosa noção de eternidade não deixe de perdurar
Curioso existir, sabendo-se a si, ao mesmo tempo em que imersos na dúvida
Toda nossa programação depende deste dia fictício chamado “amanhã”
E apesar da arrogância desta incerteza toda, continuamos indo, indo e indo...
Nossas variações são tempos verbais conjugados só no futuro do imperfeito

Espera
    Que esperança
            Quem dera
                   Ainda criança
                          Nunca morrerá
                                Será?
                                      Há?
                                          Ah!
                                             Quem sabe
                                                    Um dia
                                                            Tudo acabe
                                                                   Vire poesia
                                                                           Que hoje –
                                                                                 Só por hoje –
                                                                                          Quem diria
                                                                                                 Nada acabará...

É estranho pensar e ter que usar esta capacidade toda justamente para ser
Quando “ser” é apenas deixar-se, e, ironicamente, não pensar neste “si”
Nossa unidade de medida que conta mais é apenas, e tão somente existir

O agora se escondeu
Querendo escapar
Foi olhar para frente
E, novamente
Perdeu a hora
Que não quis passar
...
Nossa parte animal – nosso todo – é cronicamente inadequada para nós
Aquilo que nos faz individualisticarbitrariamente nós é a nossa falsa impressão
Então caímos nos truques midiáticos, nas malhas das mentiras incansáveis
Somos tão inteligentes que somos perfeitos para parar de pensar de imediato
Ser humano é curioso porque existir...
Existir é tentar e nunca parar de tentar. Mesmo conseguir é tentar:
Tentar não pensar em perder, pois sempre perder nos faria parar... De tentar
Como se o deus de cada um patrocinasse estes projetos particulares de vida
E a própria vida fosse um plano de fundo espesso que precisasse de nós
Porque mesmo o mais incrédulo ou ateu crerá num deus que o faça continuar
Assim o queira, pois para que continue dependerá de algo maior que só ser
E este algo maior o remeterá imediatamente a si próprio, como uma metástase
O que criará uma imagem que, embora à sua semelhança, não poderá ser a sua
E assim por diante no débil raciocínio que se auto decompõe de inutilidade
Declinamos nossa legitimidade a uma falsa sensação de que a qualquer momento...
Somos perfeitos para deixar de funcionar, de súbito, anulados por nossa razão
A mesma razão que espalha opiniões recursivas pelo mundo e vida a fora
Eu repito
O que acredito
Eu falo
O que me calo
Eu digo
O que me umbigo
Eu nego
O que me prego
Eu sei
O que me serei
Eu sinto
O que me minto
Eu vivo
O que me privo
Eu trago
O que me estrago
Eu amo
O que me reclamo

...

Apesar de nossos prólogos contrassensos
Somos propensos a densos monólogos. 




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